terça-feira, 16 de novembro de 2010

ainda com saudades da minha avó

quando a adolescência me alcançou, meus avós estavam de volta a são lourenço, no sul de minas gerais. os perrengues econômicos os expulsaram do rio de janeiro. passaram pela baixada fluminense, por mais algumas cidades pelo sudeste - meu avô gostava muito de mudar - mas tinham sossegado o facho num casinha tão comprida quanto estreita. ficava ao lado da casa da minha tia-avó. irmã mais velha da minha vó, que logo o câncer levou. antes de morrer, essa tia teve que amputar o braço. me lembro dela. muito miudinha. muito branquinha e sem o braço. era que nem um passarinho alquebrado. mesmo após a morte da irmã, a minha avó ficou nessa casa-trem. pelo menos era assim que me parecia. um enorme corredor, de onde saíam os quartos - dois, o banheiro, uma salinha de estar/tv, uma salinha de jantar e a cozinha. antes de começar isso tudo, tinha uma espécie de ante-sala. era lá que a dona aparecida instalou a sua cadeira de balanço. nessa cadeira, ela fazia o seu crochê e rezava o terço. eu já era adolescente e ela ainda mais vózinha. a audição piorara, mas, em compensação, tinha dado um fim na catarata. enxergava com a ajuda de uns óculos de lentes totalmente fundo de garrafa. mais ou menos que nem os óculos que eu usava na época e que me permitiam ver o mundo, apesar dos oito graus de miopia. foram muitas e muitas férias naquela casa-trem. assim, como nós duas fazíamos no rio de janeiro - durante a minha infância - um dos programas favoritos  era bater perna pelas ruas. eu era parceira nas idas ao supermercado carrossel. ficava a uns oito quarteirões de casa. no caminho, tinha um chaveiro e o filho do chaveiro era simplesmente deus em forma de gente de tão lindo. obviamente, que eu não perdia a chance de dar uma paquerada. mas tentava fazer isso de forma discreta, para a vó não ver. afinal, paquerar na frente de avós não é totalmente recomendável. mas, não é que a danada. quase cegueta de marré de si, que nem o mister magoo dos desenhos, não perdia uma...lá vinha ela: ele olhou!!! como é que você viu, vó?? ela ria!! em são lourenço, conheci umas primas - ela que apresentou, com quem eu saía. a gente adorava uma rua. só que meu avô decidira que eu tinha que estar em casa às dez da noite. era um suplício...vez em quando, a noite estava ótima. os moços lindos e dando bola e eu tinha que voltar. acontecia de não chegar na hora, quase sempre aos domingos. quem conhece o interior de minas, sabe que as noites de domingo são as melhores. cheias de gente, por conta das missas do fim de tarde. pois é..quando me atrasava, era um sufoco. de longe, via através da porta de vidro, as chamas das velas que a vó tinha acendido para pedir aos santos que eu estivesse boa e que a bronca do vô não fosse grande demais. eu sempre ficava de castigo quando isso acontecia. castigo que ele dava. não podia sair à noite. tinha que ficar em casa. bom..só que a vó dava sempre um jeito de a punição durar no máximo uns três dias - segunda, terça e quarta - quando eu não fazia a menor questão de sair. muito melhor ficar lá com ela vendo novelas - que ela via grudada no aparelho de televisão para poder enxergar e ouvir - ou jogando baralho. sempre buraco. eu, ela e meus dois irmãos. o que a vó descartava de canastra para a dupla adversária não está no gibi. eu ficava brava até com ela, mas com o jeito de vó, ela ria...e ficava assim. vez em quando, a gente até ganhava. e o cheiro da minha avó!!! nunca mais na vida encontrei alguém que cheirasse tão bem. enquanto escrevo, me vem essa lembrança olfativa! era uma delícia. igualmente delicioso, era contar para ela as minhas travessuras de adolescente. claro que com uma certa censura. se bem que comparando com as outras moças que conheci, eu era bem santa. mas, teve uma vez que fiz uma arte enorme. simplesmente troquei uns beijos mais, digamos assim, beijados, com um moço que na época era noivo. noivíssimo!!! totalmente noivo!! os beijos foram escondidos, mas cidade pequena, sabe como é, né! tem sempre um que vê e dá com a língua nos dentes. no dia seguinte, me toca a campanhia. a vó vai abrir e quem está lá??? a noiva ofendida e querendo tirar satisfações comigo!! muito bonito!!! a dona aparecida atende a moça, que já vai descascando. acabando com a minha raça - merecidamente, aliás. eu tinha mesmo beijado o noivo. uns anos depois, eu e ele até namoramos - quando ele não era mais noivo. bom, a minha vó mandou me chamar e lá vai eu para porta!! larissa, você beijou o noivo dessa moça? claro que não, né, vó. eu vou lá beijar noivo de alheia!!! tá vendo minha filha, disse a vó para a noiva ofendida!!! que injustiça você está cometendo com a minha neta!! peça desculpas a ela! e resolva seus problemas com o seu noivo! a moça, botou o rabo entre as pernas e foi embora! e eu lá. com a maior cara de santa do mundo. porta de vidro devidamente fechada, a vó pergunta: beijou ou não beijou? beijei, vó! não me faça isso de novo! tá bom vó! e cumpri o combinado. o noivo da alheia ficou me rondando um tempão, mas eu só dei bola para ele de novo, quando a solteirice voltou a ser o estado civil do gajo. ah! a vó não contou essa história para meu vô e aí, nem fiquei de castigo. agora..fala a verdade. não é uma vó muito jóia!!!

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